sexta-feira, junho 26, 2020

Liberdade e Pandemia

A pandemia que assusta o mundo também tem se tornado uma justificativa torta para governantes atacarem as liberdades duramente conquistadas ao longo do tempo em suas nações. Os exemplos surgem de todos os lados e muitas personalidades, entre eles empresários, intelectuais, escritores e ex-Presidentes, tem alertado para o riscos de vermos cerceados os direitos individuais e a livre iniciativa.

O primeiro movimento foi a divulgação de um manifesto pela Fundación Internacional para la Libertad (FIL), encabeçado pelo escritor hispano-peruano, vencedor do Nobel de literatura, Mario Vargas Llosa. A preocupação começa diante das medidas adotadas por alguns países que restringiram liberdades e direitos básicos usando a justificativa do confinamento para evitar a expansão da doença.

Alguns governos identificaram na pandemia a oportunidade de atribuir-se um poder excessivo com vistas a suspender instrumentos do Estado de Direito, incluídos mecanismos que garantem a democracia representativa e o sistema de justiça. São citadas “as ditaduras de Venezuela, Cuba e Nicarágua” onde “a pandemia serve de pretexto para aumentar a perseguição política e a opressão”.

É preciso estar atento a movimentos autoritários de governos que possuem o hábito de suprimir liberdades e perseguir seus cidadãos. No que tange a economia, o momento segue no mesmo sentido, ou seja, aumentar a intervenção com vistas manter maior controle sobre seus mecanismos, causando dano irreparável ao livre mercado.

O exemplo mais recente veio da Argentina, que moveu-se nesta direção nas últimas semanas. O governo de Alberto Fernandez resolveu intervir na exportadora de grãos Vicentin por 60 dias. A ideia, entretanto, é estatizá-la em caráter definitivo. O movimento assustou o agronegócio argentino. Ficou claro que o governo acredita que a intervenção econômica é uma resposta adequada para vencer a pandemia. Não surpreende que o ex-Presidente argentino Mauricio Macri, seja um dos nomes que assinam o manifesto liderado por Vargas Llosa.

O México também merece atenção, uma vez que se identifica uma grande pressão contra a iniciativa privada, com a utilização do Grupo de Puebla (fórum politico de ideologia de esquerda) para atacar também os grupos políticos de oposição. O ex-Presidente mexicano Ernesto Zedillo juntou-se a Vargas Llosa e Macri assinando o manifesto da FIL. Assim como eles, também firmaram o documento os ex-Presidentes Álvaro Uribe, da Colômbia, Luis Alberto Lacalle e Julio María Sanguinetti do Uruguai, Alfredo Cristiani de El Salvador e Federico Franco do Paraguai, além de José María Aznar da Espanha.

O surgimento do estatismo, intervencionismo e populismo como falsos instrumentos de combate a pandemia, nos colocam longe da democracia liberal e da economia de mercado, pilares essenciais do sistema democrático. Evitar que governantes usem a esta justificativa para erodir as liberdades é um dos mais importantes desafios deste conturbado período que passa o mundo. A pandemia jamais pode se tornar uma justificativa para o autoritarismo.

domingo, junho 21, 2020

Novo Comércio Internacional

A crise econômica gerada pela pandemia causou danos aos fluxos de comércio internacional, isto porque se imagina que passaremos por um período de refluxo mercantil externo, com as nações voltadas mais aos seus mercados internos. Apesar desta leitura, fato é que novos caminhos estão se abrindo e aqueles países que souberem se adequar ao que convencionou-se chamar de nova realidade comercial global podem fazer suas economias responder mais rapidamente.

O mundo, que após a crise financeira de 2008 já vem passando por um movimento de desglobalização, busca um novo meridiano geoeconômico consistente. Nosso país, que soube fazer movimentos importantes na crise, elogiados inclusive pelo Banco Mundial, ainda precisa romper as amarras que mantém nossa corrente de comércio em patamares muito baixos, cerca de 25% do PIB. Com uma tarifa média de importação 16%, ainda estamos muito longe dos futuros parceiros de OCDE, que navegam em níveis mais favoráveis ao comércio, em torno de 2%.

Sabemos, entretanto, que nosso país pode ir além. Neste momento crucial, onde novos desenhos e arranjos são delineados, existe chance para o Brasil trabalhar uma agenda inteligente, atraindo parcerias, impulsionando a economia e a geração de empregos. Movimentos bem calculados podem inserir nosso país em cadeias globais de valor dentro destes novos eixos dinâmicos da economia mundial que passam a surgir neste momento.

Nossas exportações, que crescem a taxa média anual de 9,7%, com participação de apenas 1,2% no quadro global ainda são resultado de um modelo ultrapassado de substituições de importações. Ao contrário da Coréia do Sul, que trabalhou este instrumento de forma inteligente, utilizando métricas de performance, o Brasil acabou criando uma fortaleza de interna de privilégios. Precisamos quebrar este ciclo, pois sabemos que nosso potencial está muito além deste passado.

Uma abertura comercial está longe de ser apenas redução de tarifas e cotas. Logo, precisamos também de realinhamento estratégico e reposicionamento de nossa presença comercial no exterior, um plano de mobilidade global que torne o Brasil um player efetivo do comércio internacional. Uma estrutura organizada, leve e efetiva, que sirva de base para nossos exportadores, ao mesmo tempo que funcione como elemento propulsor de novos negócios, aquilo que convencionou-se chamar de intelligentsia, um corpo técnico estrategicamente alocado no exterior exclusivamente dedicado a abrir mercados e oportunidades.

Nossos business desks precisam estar espalhados em lugares como Baku, Bangalore, Cidade do Cabo e Singapura, apenas para citar alguns. Na Índia, que há quatro anos cresce mais que a China, há espaço para forças modernizantes vindas do exterior, com demanda, por exemplo, para infraestrutura e commodities. As oportunidades estão postas. Ao agir de forma inteligente, o Brasil pode se colocar de maneira estratégica no novo desenho do comércio internacional.

Dos mercados populares do Brasil, ao indígena de Otavalo, no Equador, passando pelo Kejetia, em Kumasi, Gana e o flutuante de Bangkok, na Tailândia. Do Mercado de Djemaa el Fna, em Marrakech, no Marrocos, ao conhecido de peixes Noryangjin, em Seul, na Coreia do Sul; e tribal em Bati, na Etiópia; a humanidade foi moldada na liberdade econômica em sua trajetória. Especialmente no período pós-pandemia, existirá ainda mais lugar para um novo intercâmbio econômico-comercial que o Brasil pode ocupar de forma eficaz e inteligente.

quinta-feira, junho 18, 2020

A Origem

Na medida que o Brasil aos poucos vai reabrindo e tentando retomar atividades laborais que estavam impedidas em razão do isolamento social, muitas perguntas ainda precisam ser respondidas. É preciso saber se nosso país está reabrindo cedo demais, se corremos o risco de sofrer com uma segunda onda ou até mesmo se realmente atingimos o pico da primeira.

Antes de tudo precisamos entender as origens do vírus que mudou o mundo como conhecemos, a desinformação inicial e as teorias conspiratórias que há meses fazem parte do imaginário popular. Isto tudo pode nos ajudar a impedir novas pandemias no futuro.

Existem evidências que levam a suspeitas de que o Instituto de Virologia de Wuhan, China, localizado no epicentro da pandemia, possa ser o nascedouro do problema. Ali são realizadas pesquisas com vírus altamente contagiosos originários de morcegos e o DNA da composição do vírus possui um perfil semelhante em 96% a de um morcego encontrado 1.000km ao sul de Hubei, Wuhan.

O controle inicial da doença foi falho. A Universidade de Southampton realizou estudo neste sentido. Segundo esta pesquisa, uma intervenção inicial e combinada teria sido crucial para evitar a propagação viral. Estima-se que esta ação poderia ter reduzido o contágio em 66% na primeira semana, 86% na segunda e 95% na terceira. Se isto tivesse sido feito com antecedência, dizem os pesquisadores, teríamos evitado a situação atual e a doença não teria se espalhado pelo mundo.

Wuhan passou por período radical de lockdown, entretanto, o governo comunista chinês ainda precisa explicar porque os voos desta província para dentro do país foram suspensos, ao mesmo tempo que a malha aérea para a Europa, no mesmo período, ficou aberta, servindo como porta de entrada para o vírus no continente. Estas e outras são questões que ainda precisam ser respondidas no contexto das relações internacionais.

Assim, no período pós-pandemia haverá uma discussão profunda sobre a relação internacional com a China por diversos países e blocos. A União Europeia já tem se movimentado neste sentido, uma reação puxada por Suécia e França, que vem encontrando apoios na medida que a reação de Pequim se torna mais dura. Já os americanos há tempos questionam a sino-dependência mundial e encontraram um caminho que justifica suas preocupações.

Por certo o Brasil fará parte deste jogo internacional e já é possível sentir um distanciamento entre Pequim e Brasília. Um movimento que, impulsionado pela tendência mundial, pode levar nosso país a diversificar seus parceiros comerciais diminuindo a dependência comercial brasileira dos chineses. Estes são fluxos que podem inclusive levar a um derretimento dos BRICS.

Fato é que esta pandemia mudará para sempre o mundo. Desde as relações pessoais, profissionais, hábitos e costumes, o que convencionou-se chamar de “novo normal” até as relações comerciais e os movimentos diplomáticos internacionais. O mundo pós-pandemia tende a ser muito diferente. Ao mesmo que é preciso evitar um novo surto, torna-se vital um minucioso trabalho de rastreamento das origens e buscar as causas da disseminação do contágio iniciado na província chinesa.

quinta-feira, junho 11, 2020

Liberdade de Imprensa

Thomas Jefferson, um dos Pais Fundadores dos Estados Unidos, defendia que “se tivesse que escolher entre governo sem jornais ou jornais sem governo, não hesitaria em escolher esta última”. Ao redigir a Declaração de Independência norte-americana, se posicionou fundamentalmente a favor da liberdade como pilar fundamental da nação que nascia naquele momento e que acabou por influenciar de forma determinante os sistemas políticos tal como conhecemos.

O mundo vive um período delicado no que tange a liberdade de informar. O advento das redes sociais e das fake news tem mexido de forma profunda com o jornalismo e a política. Este é um binômio do qual não podemos nos afastar, uma vez que a política e a liberdade de expressão caminham lado a lado na construção e no fortalecimento de sistemas democráticos.

Além disso, muitas nações tem optado por calar seus cidadãos, cercear o trabalho da imprensa, restringir as redes sociais, além de encarcerar jornalistas por simplesmente executar seu ofício, o que representa um ataque contra uma base fundamental da democracia. De acordo com as entidades internacionais de monitoramento da liberdade de expressão, enxergamos esta triste realidade em países como China, Rússia, Turquia, Venezuela, entre tantos anos. O tema está na pauta mundial e tornou-se impossível silenciar diante dos fatos.

De acordo com o relatório do Comitê para a Proteção dos Jornalistas, sobretudo na na China, em meio a um crescente ataque de regimes autoritários contra a mídia independente, muitos jornalistas são acusados de "cometer crimes contra o Estado" ou de espalhar o que é considerado pelo governo como "notícias falsas”.

Entre os casos emblemáticos, o Comitê para a Proteção dos Jornalistas cita a chinesa Sophia Huang Xueqin, presa em outubro de 2019 depois de descrever em seu blog sua experiência nas manifestações pró-democracia em Hong Kong, e o iraniano Mohamad Mosaed, que enviou um tuite durante um corte de Internet destinado a limitar a divulgação de notícias sobre uma manifestação contra os preços dos combustíveis.

No período em que se lembra do aniversário dos protestos por mais liberdade em Pequim, na Praça da Paz Celestial, os olhos se voltam mais uma vez para China, quarto pior no ranking de liberdade de imprensa no mundo e país que mais prende jornalistas, mantendo 109 profissionais atrás das grades, segundo balanço da organização Repórteres Sem Fronteiras. Outra entidade, a organização de direitos humanos Human Rights Watch pediu às autoridades chinesas a liberação de três ativistas e dois jornalistas que desapareceram após reportarem publicamente sobre o surto de Covid-19.

Certamente o Brasil está longe da China, carregando em seu sistema constitucional princípios que regem a liberdade de imprensa., opinião e expressão. Apesar disso foram constatados 208 casos de violência contra veículos e jornalistas em 2019. Em tempos de fake news e redes sociais, somente uma imprensa forte e independente pode evitar a erosão de direitos que se tornaram o principal sustentáculo de nosso sistema democrático.