sábado, janeiro 30, 2021
Habemus Vacina
sexta-feira, janeiro 29, 2021
Em Defesa da Democracia
Trump passa longe de ser um conservador. Isto afastou o ainda Presidente da base tradicional dos republicanos, abrindo espaço para o ingresso de uma ala radical de corte populista. O eleitorado tradicionalmente conservador, representado no governo pelo Vice-Presidente Mike Pence, é regido pelo princípio da prudência, defensor da cautela, estabilidade e moderação, elementos fundamentais desta vertente política. Na última semana vimos o rompimento definitivo destas alas diante do ataque perpetrado contra a democracia americana.
No Brasil, vivemos situação similar. Possuímos um Presidente que se diz conservador, mas passa longe dos princípios da prudência, cautela, estabilidade e moderação. Pelo contrário, quando mais incendiar o debate público, melhor para Bolsonaro, que assim como Trump, aposta na polarização e no embate como elementos fundamentais da política. Entendimento, convergência e diálogo são palavras que passam longe de seu vernáculo político. Longe de ser um conservador, Bolsonaro tornou-se um populista.
Isto fornece um sinal de alerta para a população brasileira. Assim como em Washington, em Brasília existe um Presidente que não possui apreço pela democracia e está disposto a quebrar as regras do jogo se assim for de seu interesse. Bolsonaro reiteradamente profetiza que as eleições brasileiras serão fraudadas (especialmente se perder) e não hesitará em esticar a corda, assim como o colega americano, em caso de derrota.
Devemos nos perguntar se nossas instituições estão preparadas para tamanho desafio. O Brasil não pode sucumbir diante de mais um tiranete de plantão a despachar no Palácio do Planalto. Foram 21 anos de ditadura e nossa democracia, jovem e vibrante, não merece tamanho desrespeito. Os pilares da justiça, assim como do parlamento, serão fundamentais neste momento de prova. Mais do que isso, no intuito de evitar um autogolpe, a democracia brasileira precisa pressionar pelo desembarque imediato dos militares do governo Bolsonaro sob pena de confundirem-se com as aventuras anti-democráticas de um simples capitão.
O mundo assistiu atônito as manobras de Trump para permanecer no poder. Sofrerá duras consequências nos tribunais assim que deixar a Presidência. Com dois impeachments aprovados pela Câmara, sairá pelos fundos da Casa Branca e certamente em pouco tempo ocupará um lugar de ostracismo na História. Populistas podem parecer grandes hoje, mas assim como sobem, descem. Que nossa democracia e instituições sejam mais fortes que os ímpetos golpistas dos oportunistas que transitoriamente ocupam o poder.
segunda-feira, janeiro 18, 2021
Trump: Populismo Impedido
Trump, assim como Bolsonaro, fazem parte de uma safra de líderes que foram eleitos na esteira de uma nova política que dizia rejeitar os velhos métodos e operações tradicionais de poder. Governam limitados pela polarização e o confronto, longe, portanto, do diálogo, entendimento e moderação. São populistas na medida que buscam uma interação com a população que passa ao largo dos instrumentos institucionais tradicionais.
Esta liderança, apesar de chegar ao poder pela direita política, não possui viés conservador, uma linha política orientada pelo princípio da prudência, temperança, cautela, estabilidade e moderação. Ao adotar um modelo de confronto, disruptivo com a política, Trump tomou contornos antidemocráticos, agregando ao seu lado radicais de diversos matizes, rompendo com os princípios defendidos pelo seu próprio partido.
Isto explica o placar de seu segundo impeachment na Câmara de Representantes. Além dos democratas (mais de duas centenas apresentaram o pedido em conjunto), republicanos se juntaram ao esforço de punir o Presidente pelo movimento de insurreição contra a democracia. O fato é inédito e pela primeira vez depois de muito tempo pudemos enxergar uma agenda bipartidária que uniu as duas forças na Câmara.
Aprovado o impeachment, o caminho agora é o Senado, que pode aprovar o pedido de afastamento do Presidente do cargo. Ali são necessários 67 votos. O debate, entretanto, deve ocorrer somente com o novo Senado, que será empossado em alguns dias. A acusação pode levar a inabilitação política de Trump, algo que deve ser decidido em uma segunda votação por maioria simples, caso seja aprovado o afastamento. Isto ocorre porque a base da acusação está alicerçada na tentativa de insurreição.
Trump é apenas o terceiro Presidente a ter um impeachment aprovado pela Câmara de Representantes. Antes dele, apenas Andrew Johnson (1868) e Bill Clinton (1999) haviam enfrentado o processo. Ambos foram absolvidos pelo Senado. Trump foi alvo de dois pedidos aprovados, em 2020 e 2021. Absolvido no Senado na primeira acusação, tem grandes chances de ser considerado culpado diante da segunda.
Barbárie não rima como democracia, assim como insurreição não rima com liberdade. Trump sentirá o peso da lei sobre seus ombros assim que deixar a Presidência. Será alvo de inquéritos, investigações e processos. A nação americana é extremamente rigorosa no cumprimento da lei e no respeito à democracia. Trump atingiu dois pilares essenciais da república e certamente não terá vida fácil assim que deixar a Casa Branca.
Apesar dos mais de 70 milhões de votos, Trump vive seu ocaso político. Seus planos passam por organizar um movimento de direita que possa levá-lo de volta ao Salão Oval em 2024. A tarefa é praticamente impossível. Deve ser expulso de seu partido e terá mais trabalho para evitar condenações sérias do que trabalhar por um futuro político. Enquanto isso, os republicanos certamente passarão por uma faxina profunda para se livrar dos resquícios populistas, deixando esta triste marca para trás.
O ocaso de Trump marca também o início do fim da experiência populista que seduziu algumas nações. Estamos aos poucos de volta aos pilares da sensatez, moderação e diálogo, elementos fundamentais de uma boa política. O trauma vivido pelos americanos diante da invasão do Capitólio servirá de vacina contra novos aventureiros, assim como o mundo precisa se preparar para também despachar seus populistas do poder. Nesta batalha, a democracia certamente irá prevalecer.
sexta-feira, janeiro 15, 2021
Líder da Oposição
O melhor para Bolsonaro seria enfrentar uma oposição organizada e sistemática. É notório que o Presidente delineia seu discurso no antagonismo e nada melhor para isso do que um grupo oposto atuante e com voz. Foi nesta dinâmica que criou o personagem que surfou na rejeição aos políticos e chegou ao Palácio do Planalto. Bolsonaro é cria de uma dinâmica pendular executada pelos petistas e que agora se repete da maneira inversa.
Fato é que mesmo desencontrado, o petismo poderia incomodar mais o governo. Na dinâmica estabelecida contra Fernando Henrique encontraram a senha para chegar ao poder, mas diante de Bolsonaro estabeleceu-se outra prática. Ao perceber que possuir uma voz ativa contra o Planalto somente faria o Presidente crescer, optou-se pelo silêncio, discrição e distanciamento.Bolsonaro hoje é um Presidente em busca de um antagonista. Já tentou com Witzel, Doria, Maia e um sem número de políticos. A joia da coroa, entretanto, é Lula e os movimentos que veremos a seguir, que podem reabilitar o ex-Presidente cassando sua inelegibilidade e colocando seu nome na pista para a sucessão de 2022, fazem parte do teatro de operações bolsonarista com vistas a reeleição.
Dependerá do petismo morder a isca ou se movimentar de forma inteligente no cenário eleitoral. O duelo favorece a ambos, que precisam um do outro para se viabilizar em um segundo turno. O antagonismo, movimento pendular que retroalimenta os extremos é a justificativa para ambos existirem e duelarem pelo poder. Contudo, se eleitor mostrar-se cansado da polarização, uma terceira via pode surgir de forma equilibrada e viável.
Até este cenário se concretizar, Bolsonaro segue sendo Presidente e, na falta de um antagonista, também líder da oposição de seu próprio governo, travando suas próprias guerras, criando inimigos e partindo para a ofensiva. Ao negar a pandemia e comprar uma batalha contra a imprensa, busca criar narrativas e oposição. Quanto mais semear a discussão, mais terá possibilidade de aparecer de um lado deste duelo e para ele, no campo intuitivo da política, é isso que importa.
Se o modelo de Bolsonaro prevalecerá, ainda é uma incógnita, mas tendo a acreditar que seu jeito de fazer política se esgota diante de emergências sérias que demandam gestão e ações além das narrativas. A pandemia, que ceifou a vida de praticamente 200.000 brasileiros, débacle econômico com um deficit fiscal assustador, desemprego, fim do auxílio emergencial e ausência de uma estratégia consistente de vacinação podem deixar sua retórica pelo caminho, assim como os sonhos de uma reeleição, seja como líder de seu governo e também de sua própria oposição.
quinta-feira, janeiro 14, 2021
Década do Brasil
Dez anos atrás vivíamos um mar de ufanismo. Enquanto muitos diziam que nosso país estava na moda, que esta seria a década do Brasil e tudo se encaminhava para crescermos de forma nunca vista, sempre olhei para este cenário com certo grau de ceticismo. Quando analisamos cenários, sempre precisamos olhar para o histórico a fim de desenhar os rumos que temos adiante. Foi o que fiz.
Nada nos indicava que os elementos basilares de nossa nação haviam evoluído para aproveitarmos a onda a favor que se formava. Construímos uma democracia, realizamos privatizações, desenhamos um modelo de capitalismo social, mas ainda em nossa base havia elementos da política de compadrio, impunidade, corrupção e incerteza, fatores que impedem a adoção de ferramentas reais de impulsionamento social e econômico. Havia maquiagem, mas faltava substância.
Sabemos que o Brasil não perde a oportunidade de perder oportunidades. Uma década depois da euforia, vivemos a depressão. Além de nosso país não pegar embalo na onda favorável, retrocedeu. O empobrecimento médio da população na década foi o mais intenso em 100 anos. Além de não crescer, o Brasil regrediu. Nos anos Dilma despencou 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016. Diante da pandemia em 2020, as expectativas são de um novo tombo de mais de 4%.
Sem um arcabouço de reformas estruturais, políticas de longo prazo e embalado pelo populismo da nova matriz econômica, certamente o crescimento não viria, mesmo que impulsionado por uma gigante onda a favor. O desencadeamento da Lava Jato foi apenas mais um capítulo da história deste castelo de cartas que se desmontou, pois apesar de alto, era frágil. Um modelo de capitalismo de Estado baseado na política do compadrio e nos instrumentos de corrupção que realizavam a manutenção do sistema.
Vítima dos próprios erros, nosso país paga um preço alto, que além de tropeçar em uma década perdida, assim como nos anos 1980, tem como vítima principal uma geração que esperava ter superado o passado. Mais uma geração perdida, reformas inacabadas, prejuízos sociais incalculáveis. O retrato do Brasil, dez anos depois, é desolador. Em uma década, aquela que deveria ser nossa, o mundo cresceu 30,5% e nosso país apenas 2,2%.
Chegamos ao fim de mais uma década que deveria ser esquecida, mas que serve de alerta. O Brasil precisa deixar de ser refém de seus próprios erros, da política de compadrio e da corrupção endêmica que corrói nossas instituições. É preciso olhar adiante aprendendo com os erros do passado. Que o fim destes dez anos sirva de recomeço, entendimento, diálogo e unidade, afinal, todos dependemos do sucesso de nosso país. Mesmo com ceticismo, um novo ano é sempre motivo para renovarmos nossa crença em dias melhores.