segunda-feira, abril 12, 2021

Fantasia do Autogolpe

Ao gerar crises, Bolsonaro tenta invariavelmente criar narrativas que encubram os erros de seu governo. A mais recente é flertar com a ruptura institucional, sugerindo ações que passam por medidas que podem suprimir direitos democráticos justificando que está preservando liberdades individuais. Nada mais prosaico no manual da autocracia: golpear o sistema alegando que está preservando liberdades. 

Vivemos um período delicado, que se tornou ainda mais difícil diante da inépcia de Bolsonaro. Ao negar a pandemia e se tornar refém de suas próprias ideias obscuras, o Presidente preferiu não investir em vacinas com antecedência, preferindo patrocinar um suspeito tratamento precoce sem qualquer eficácia. Hoje, diante de uma vacinação lenta, o país fornece sinais de fadiga e desesperança. 

Tudo indica que Bolsonaro possa estar jogando na retranca por método, semeando o caos para ali na frente colher resultados. Desestabilizar o jogo faz parte de uma intricada jogada que aposta no desgaste da economia e avanço da pandemia, podendo impulsionar manifestações, desalento e revolta. Em outras palavras, convulsão social. Um método líquido e certo para solicitar intervenção ao parlamento por meio dos instrumentos constitucionais amargos que suspendem algumas liberdades individuais. 

Por mais que poucos acreditem na consecução de um enredo deste tipo, é fácil ler nas entrelinhas os caminhos trilhados em discursos e declarações nas últimas semanas. O fato inédito da inusitada troca no comando das Forças Armadas abre um perigoso caminho de questionamento quanto aos reais objetivos de Bolsonaro, uma vez que os comandantes anteriores pareciam mais fiéis aos ditames constitucionais do que aos desejos do ocupante do Planalto.

Cada vez que um líder se torna mais fraco, mais precisa de demonstrações de força. Bolsonaro segue acuado, caindo nas pesquisas, com a economia em frangalhos e a pandemia cercando a inépcia de seu governo. As pesquisas captaram esta insatisfação. 83% dos brasileiros desejam mudança, o que demonstra que o governo escolheu os rumos e as amizades erradas. O estelionato eleitoral está cristalino para o eleitor. 

Diante disso, a fantasia do autogolpe é um delírio que acalma Bolsonaro nas horas mais difíceis, assim como o exercício do poder de nomear e demitir, além de mandar homens do mais alto grau hierárquico das Forças Armadas (carreira onde fracassou) para a reserva. Há algo de revolta, revanchismo e amargura nestes movimentos. Delírios que se misturam com o poder da caneta presidencial. 

Somos presididos por um homem em conflito, perseguido por seus próprios fantasmas e suas teorias de conspiração. Enquanto o país busca a saída de uma crise sanitária de proporções globais, a inoperância de um governo perdido busca encobrir seus erros gerando novas e sucessivas crises. A fantasia de um autogolpe serve de forma perfeita para aqueles que vivem alheios à realidade, trancafiados em seu próprio mundo, enquanto o povo sofre as consequências de seus delírios. Um enredo que nunca terminou bem e por aqui certamente terá um triste desfecho.

sexta-feira, abril 09, 2021

Declínio Bolsonarista

Bolsonaro é o ponto inicial e final desta história. Isto porque chegou à Presidência da República embalado em uma onda de reformas, mudanças e esperança. Representava a ruptura com os erros do passado e a vontade de fazer política de uma maneira muito diferente daquela que reinava no país há tanto tempo. Embalado pelo lavajatismo e também pelo antipetismo, tinha o apoio para fazer as coisas de forma diferente. 

No poder, Bolsonaro voltou a encarnar o deputado do baixo clero que transitou pelo parlamento por quase três décadas. Retomou um discurso de campanha, levando a beligerância para dentro do Palácio do Planalto. Longe de governar, passou a usar a tática do enfrentamento como motor de suas narrativas. 

No Congresso Nacional optou pela pauta de costumes, deixando as reformas estruturais em segundo plano, assim como as iniciativas anticorrupção propostas pelo Ministro da Justiça, Sérgio Moro. Mesmo assim, mais por empenho do parlamento do que realmente por esforço do governo, conseguiu aprovar uma Reforma da Previdência. Se tornaria a única vitória em um deserto de propostas. 

Ao encarar a pandemia, percebeu-se, o Brasil não havia feito a lição de casa. As reformas seguiam emperradas, a liderança do governo era amadora e Bolsonaro seguia mais interessado em criar narrativas do que encarar a realidade. Em pouco tempo a inércia cobrou o seu preço. Contas desajustadas, leitos lotados, descrédito governamental enquanto o Presidente conduzia seu show alicerçado em cloroquina e negacionismo. 

Depois de um ano de pandemia, o foco surge na reeleição e dentro de uma nova coalizão capitaneada pelo centrão. Mas talvez seja tarde demais. Sem recursos e endividado, o país surge mais cético e decepcionado com a falta de resultados do bolsonarismo. O populismo presidencial perde seu encanto na medida que a realidade se abate diante dos bolsos dos brasileiros, agora vazios, encarando uma variante de vírus letal.

Acenos antidemocráticos, crises intermináveis, incompetência na compra de vacinas, choques entre os poderes e enfrentamento com o alto comando militar são apenas alguns dos ingredientes de uma presidência que passa longe de suas promessas e acenos eleitorais. Um verdadeiro estelionato eleitoral que cala fundo em enorme parcela da população que acreditou nas palavras de um presidente, hoje desacreditado. 

O descrédito de Bolsonaro se ampliou em suas bases eleitorais. Está longe dos liberais, lavajatistas, conservadores e antipetistas. Conseguiu se afastar do mundo financeiro, que divulgou manifesto contra o governo, ao mesmo tempo que entrou em choque com os militares, resultando no afastamento conjuntos dos comandantes das Forças Armadas. 

Bolsonaro desembarca em 2022 controlando a máquina, mas eleitoralmente fraco. Pressionado pelos números de Lula e pela possibilidade de uma candidatura de centro, pode inclusive ficar fora do segundo turno. Não foi por falta de aviso. O declínio bolsonarista é um fenômeno previsto. O Brasil é muito grande para ser governado refém de narrativas populistas. Ao desconhecer as razões de sua vitória em 2018, segue firme em direção da derrota em 2022.