sexta-feira, maio 01, 2020

Segundo Ato

O governo Bolsonaro, tal como conhecemos, encerrou seu primeiro ato. O que inicia neste momento é uma nova versão, com alianças diferentes e outro equilíbrio de poder, além de novos objetivos. As cartas colocadas sobre a mesa assim que Bolsonaro chegou ao Planalto passam a fazer parte de um jogo antigo. As agendas iniciais submergem nesta nova dinâmica que deve pautar o governo até seu final.

Os novos atores deste segundo movimento do governo Bolsonaro preparam seus instrumentos para entrar em cena, diante de um enredo que pouco se parece com os primeiros acordes ouvidos na sua chegada ao poder. Saem do cenário as agendas de Moro e também o filtro econômico liberal e chega ao palco um outro arcabouço de soluções. A economia tende a passar por uma redefinição aguda, revivendo ações governamentais para impulsionar o crescimento, um plano que vai no sentido contrário daquilo imaginado pelo Ministro da Economia quando chegou em Brasília.

A política torna-se o elemento mais sensível e onde tende a notar-se a maior e mais forte guinada de todas. Ao se aproximar de uma gama de partidos para buscar sustentação do governo, Bolsonaro também freia qualquer movimento que possa nascer no parlamento com o intuito de levar sua presidência a um fim precoce. Assim como em governos do passado, tentará manter uma base mínima que evita o pior, mas que pode enfrentar dificuldade para levar adiante sua agenda.

Este casamento, onde de um lado a base parlamentar assume posições no governo e o credo liberal se perde em meio a pandemia, abre espaço para acomodação de aliados ao mesmo tempo que coloca freios em um processo de privatizações. Esta é a redefinição principal e mais aguda que irá se observar no curto espaço. Outras agendas, como agricultura, energia e transportes devem seguir na trilha conhecida, porém também ganhando adesão política dos partidos em seus órgãos derivados.

No entorno do Presidente, além desta nova base congressual, que ganhará espaço, seguem os núcleos tradicionais, como a base vinculada aos valores, os técnicos e militares, que fornecem uma forma de garantia institucional ao governo. Os nomes de confiança e de longa data ao lado do Presidente tendem a ganhar proeminência, talvez até sendo impulsionados para lugares mais importantes no médio prazo.

Esta acomodação visa trazer estabilidade para que o governo não seja abalado por terremotos políticos. Fornece musculatura para resistir, porém sem força para avançar em temas importantes de sua agenda. Tudo isso acontece enquanto as forças externas se reorganizam pensando em sua sucessão, que já entrou na pauta política e começa a se movimentar com o olhar em 2022.

A pandemia colocou o governo Bolsonaro em xeque, alterando os planos traçados para a economia, um ativo com o qual o Presidente contava para ampliar sua base de apoio. Com a retração econômica trazida pelo coronavírus e agora diante de uma crise política gerada pela perda de um aliado que emprestava sua credibilidade ao governo, os tempos são outros.

Para evitar a formação de uma tempestade perfeita, que significa unir crise política e econômica no mesmo cenário, neste caso ainda potencializada pela questão sanitária, Bolsonaro precisa se mobilizar. O caminho conhecido passa em abrir espaço no governo para partidos que forneçam estabilidade no parlamento e talvez conseguir eleger um aliado para a Presidência da Câmara dos Deputados.

A única chance de Bolsonaro evitar tornar-se um pato manco diante da crise, ou seja, um Presidente detentor da caneta, porém sem poder de fato, passa necessariamente pela costura de um acordo com aquilo que convencionou-se chamar de velha política. Se mantiver uma base engajada e capaz de construir ao seu lado uma narrativa efetiva, pode inclusive, como fênix, renascer das cinzas.

Fato é que, a partir da saída de Moro, como marco temporal, a primeira fase do governo Bolsonaro chega ao seu final. Entramos no segundo ato, que pode asfaltar o caminho para seu renascimento ou precipitar seu epílogo.

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