segunda-feira, setembro 30, 2013

Shutdown

Os americanos estão a prestes a ver o governo fechar muitos de seus serviços a partir desta terça-feira. Se o Congresso não aumentar o teto da dúvida, o Executivo terá que começar a parar de funcionar. Isto terá reflexos negativos na vida da população, mas também terá desdobramentos políticos e chegou no ponto que está, sem dúvida, pela falta de habilidade política de Barack Obama.

Os republicanos usam seus votos, neste momento, como arma política contra o Obamacare. Na verdade dizem que votam o aumento do teto, se for excluído da pauta o financiamento do projeto. Obama disse que não negociará qualquer alteração. O impasse está formado. Se não acharem um meio-termo ou qualquer um dos lados ceder, o governo começa a parar de funcionar amanhã, pois não haverá recursos para pagamento de serviços. Em 1996, durante o governo Clinton, o administração federal teve um shutdown de 23 dias.

Por certo o caminho do radicalismo de ambos os partidos, que tomaram suas agendas nos últimos tempos, não é o caminho a seguir. O atalho do bipartidarismo para a solução de problemas graves está sumindo na medida que o fosso entre republicanos e democratas aumenta aqui em Washington e Obama não contribui de forma alguma para a melhora desta situação. Ao invés de procurar uma solução negociada, parte para o enfrentamento.

Mas o problema é mais sério. O aumento do gasto público nos Estados Unidos está alcançando um ponto perigoso. Vejam o crescimento nesta tabela. A introdução do Obamacare, aumentando a despesa, realmente é motivo de preocupação entre os americanos. Cresce o poder e os gastos do Estado em um país onde seis em cada dez americanos acreditam que já passou do limite do razoável.

Obama não possui maioria na Câmara, mas no Senado tem tranquilidade para passar suas iniciativas. Por certo muitos republicanos querem dificultar a vida do Presidente, mas sempre existem grupos menos ponderados nos dois espectros políticos. Falta ao Presidente americano criar uma ponte com os moderados para temas importantes. Falta a habilidade política que sobra na campanha na relação com o parlamento.

No passado, quando senador, Obama disse que a necessidade de aumentar o teto da dívida, mostrava um país com falta de liderança. Disse que era um sinal que o governo dos Estados Unidos não consegue pagar suas próprias contas e tinha, portanto, a intenção de votar contra o aumento do teto da dívida. Pois bem, hoje ele está no Salão Oval e tem nas mãos a grande chance de fazer algo diferente. Não fez. A partir de amanhã, o governo começa a parar.

sexta-feira, setembro 27, 2013

O Incrível Vôo de Galinha Tupiniquim

O assunto não poderia ser outro. A capa da revista inglesa The Economist. Em 2009 a mesma publicação celebrava o potencial do Brasil. Enquanto o mundo vivia uma crise econômica, o nosso país crescia e tinha eventos grandiosos pela frente, as Olimpíadas e a Copa do Mundo, além do Pré-Sal. Poderia ser a década do Brasil. O governo brasileiro celebrou a matéria com entusiasmo, enquanto outros mais céticos com o rumos dos acontecimentos, onde me incluo, levantavam incertezas quanto a concretização deste potencial.

O Brasil decola, dizia a capa. Quatro anos depois, a pergunta é: "O Brasil estragou tudo"? A resposta é simples: sim, estragou. Mas qual é a novidade? Na verdade fica difícil entender a perplexidade de alguns com o rumo tomado pelo País, afinal os dados estão aí, os analistas continuam a publicar suas avaliações e há tempos alertamos para o que se desenha. Mas como dizem por aí somos da turma do contra, pessimistas, daqueles que torcem para tudo dar errado e não vemos os progressos do governo, especialmente na área social.

Na verdade há muito pouco progresso para ser comemorado. Melhorar os indicadores sociais não significa tornar parte da população dependente de mesada do governo. As mudanças precisam ser mais profundas e conjunturais. O Brasil nunca se atreveu a fazer isso. Na colheita dos frutos da estabilidade do Real, o governo Lula, e depois Dilma com mais intensidade, começaram a desarrumar aquilo que estava começando a tomar uma forma de país. Não havia dúvida que a falta de regras, desorganização da economia, conivência com a corrupção e o papel do Estado como indutor do desenvolvimento levariam a uma situação de desequilíbrio.

Vivemos uma realidade mascarada pela maquiagem de um governo que se sustenta em três pilares: mesada estatal para o pobres, concurso para a classe média e subsídio para os ricos. Mas a economia é uma ciência com suas próprias regras e a farra com dinheiro público terá um custo que começará a ser cobrado já em nosso tempo. Nossa complacência com este modelo é um ato perigoso para as futuras gerações. Se você optou por criar seu filho no Brasil, boa sorte. Você está deixando um conta que ele irá pagar também.

O Brasil perdeu mais uma oportunidade, como sempre. Não será a primeira, nem a última. Faltou competência para organizar uma simples Copa do Mundo e uma Olimpíada. O marco regulatório do Pré-Sal afastou os investidores sérios. A inflação está de volta. Isso só para ficar no básico. O vôo que alçamos é um vôo de galinha, como já lembrava o conceituado cientista político Paulo Kramer. Antes do entusiasmo se instalar, ele já previa que aquilo que viria seria um exercício pífio de crescimento. Mas  somos minoria. Não nos contaminamos pela euforia do inconsciente coletivo. Os problemas do Brasil continuam os mesmos. Enquanto você lê este texto, Dilma se recuperou do desgaste nas manifestações e as pesquisas mostram que ameaça vencer no primeiro turno. Tudo como dantes no quartel de Abrantes.

quinta-feira, setembro 26, 2013

União Republicana

Esta semana pode ter se tornado um marco para o partido republicano. O senador do Texas, Ted Cruz, discursou em pé durante 21 horas contra o sistema de saúde que será introduzido pelo governo Obama, o chamado Obamacare. Cruz não reverterá a decisão, tampouco sua atitude teve qualquer efeito prático, mas quando o senador do Kentuky, Rand Paul, chegou para apoiá-lo, percebemos que uma mudança, mesmo que tímida, no GOP está em curso.

Os republicanos vem perdendo eleições e controle do Congresso. A falta de união evidenciou aos poucos as várias vertentes do partido. De um lado, existem os mais conservadores, com forte influência no Sul, mas votos por todo país. Do outro lado uma nova geração de libertários. Ambos, entretanto, concordam com uma coisa: o governo é grande e influente demais. Vale lembrar que 6 em cada 10 americanos pensam a mesma coisa.

Esta divisão dentro do Grand Old Party (GOP), como são chamados os republicanos por aqui, enfraqueceu o partido. Se alguma atitude não for tomada, os democratas levarão a Casa Branca mais uma vez, devido a fragmentação dos republicanos. Ted Cruz é a atração da ala mais conservadora, chamado de Golden Boy do partido. Rand Paul é o incontestável líder dos libertários. O encontro destas duas novas lideranças pode levar o partido a um reencontro interno.

Ted Cruz, por mais que seja um novato no Congresso, já é considerado um líder no partido. Anunciou que nesta semana faria um discurso contra a iniciativa de Obama na saúde até não poder ficar mais de pé. Permaneceu ali durante 21 horas. Quem apareceu mais de uma vez foi Rand Paul. Apoiou o colega e iniciou a construção de uma ponte que pode levar a união dos republicanos.

Claro que a inveja tomou conta de alguns antigos falcões do partido, ainda em atividade, que protestaram contra a atitude de Cruz. Entretanto, o efeito midiático de sua atitude, aliado ao seu estilo de liderança, pode gerar mudanças internas nos republicanos. Certamente o ato de Cruz não inviabilizará o Obamacare. Os reflexos serão muito mais internos do que externos. Talvez o nome dos republicanos não seja Cruz, nem Paul, mas a ponte criada entre os dois pode servir para o próximo candidato unir o GOP.

quarta-feira, setembro 25, 2013

Gerenta na ONU

Dilma perdeu mais uma enorme oportunidade de fazer diplomacia em favor do Brasil. Preferiu fazer política doméstica no fórum político internacional mais importante do mundo. Sua mensagem não foi ouvida, tampouco repercutiu. O impacto da sua fala na imprensa americana pode ser considerada nula. O Brasil perdeu mais uma grande oportunidade de ser ouvido no mundo.

O objetivo foi jogar para a torcida e fazer coro contra os Estados Unidos. Acusou os americanos de espionagem e cancelou sua viagem para encontrar Obama na Casa Branca, em visita oficial de Estado, regabofe para qual o Brasil não é convidado desde a Presidência de Fernando Henrique, em 1995. O que Dilma esqueceu de contar na ONU foi que, desde novembro de 2010, o governo engavetou o projeto de política nacional de inteligência, que cria as bases para que o Brasil se previna contra ações de espionagem. Coisa simples para quem esperneia que foi espionada por países que possuem tais diretrizes. Dilma foi espionada, entre os coisas, porque faltou competência para seu governo levar adiante o marco regulatório que poderia evitar tais bisbilhotices. Culpa que faltou assumir.

Dilma deve ter tido tempo de refletir sobre o assunto quando voltou para o hotel St. Regis, onde ela se hospedou (infelizmente a suíte presidencial solicitada pelo governo brasileiro estava já ocupada) na suíte assinada pela joalheria Tiffany & Co, de três quartos com uma equipe de mordomos que fala português, claro. O contribuinte brasileiro pagou a diária de US$ 10 mil, o que não dá para precisar em reais, em função da flutuação do dólar, mas algo em tono de R$23 mil a R$ 26 mil reais, mais IOF de 6,38%, se pagou com cartão de crédito brasileiro, corporativo da Presidência, claro.

Enfim, Dilma poderia ter sido mais chefe de Estado e menos chefe de governo, mas é pedir muito para a Presidenta. Poderia ter falado de relações exteriores, das leis de acesso a informação pública em vigor no Brasil, engajar o país diplomaticamente em questões relevantes, falar sobre os atrativos do Pré-Sal e dos preparativos para os eventos mundiais que hospedará nos próximos anos. Mas para isso precisaria fazer um curso rápido, pelo menos, com o ex-presidente FHC. Coisa fora de questão. Mas ficou difícil para Dilma, pois o Brasil começou a fazer água. O marco regulatório do Pré-Sal acaba de mostrar sua ineficiência. Faltam regras claras em um país onde os corruptos não vão presos e a infra-estrutura, mesmo recebendo eventos do porte que vamos receber, ainda é precária.

Realmente Dilma não tinha o que vender. O Brasil coleta fracassos. Perde uma década de ouro que poderia ajudar o país a se levantar aos poucos. Realmente é mais fácil jogar para a torcida, que se ilude com palavras de uma gerenta que ecoam somente nesta nação, que cada vez mais faz questão de ser esquecida, na longínqua América do Sul. Bom mesmo é bradar contra Obama e ficar no St. Regis, afinal, o tal gigante dorme em berço esplêndido.

segunda-feira, setembro 23, 2013

Mutti Über alles?

Foi uma vitória maiúscula para Merkel. A CDU/CSU avançou e massacrou o SPD. O democratas-critãos beiraram os 42%. Os social-democratas chegaram em 25%. A diferença foi grande. Chegou a ser cogitada uma histórica maioria absoluta (mais de 50% do Parlamento), o que seria até possível dentro do intricado sistema político alemão. A CDU/CSU poderia chegar quase lá, com cerca de 301 dos 606 parlamentares do Budestag. Se não for este número, será perto.

Mas é uma vitória amarga para a Mutti. Ela perde o controle do Bundestag. Nas últimas eleições ela angariou 33,8% e os parceiros liberais do FDP 14,6%. Foi um número suficiente para que Merkel governasse em coalizão com seus parceiros preferidos, de ideologia política similar. O problema desta vez foi a falta de votos para o FDP que chegou apenas a 4,8% e sequer fará parte do Bundestag. A perda de força dos liberais nas urnas já era esperada, mas apesar de a CDU ter fortalecido sua musculatura, não foi o suficiente para compensar a perda de votos dos liberais.

No jogo político isto conta muito. Na verdade, apesar da vitória maiúscula de Merkel, com mais votos diretos do que na eleição anterior, ela perdeu o controle pleno do Parlamento. No Bundestag haverá mais oposição do que havia até ontem. Em número de deputados a coalizão governista sai enfraquecida.

Se sozinhos, o democrata-cristãos tivessem alcançado a maioria absoluta, seria um feito que não se repete desde a eleição de Konrad Adenauer em 1957. Faltou pouco. Mas um pouco que teria feito toda a diferença. De qualquer forma, ela entra para a história como sendo a terceira Chanceler no pós-guerra a vencer três eleições em sequência.

Voltando ao Busdestag, que elege a Chanceler. A CDU/CSU deve chegar a 41,5% dos votos. Dentro do sistema alemão, uma votação um pouco superior poderia fazer, mediante os cálculos eleitorais, a CDU chegar a ter maioria absoluta. Não aconteceu. O FDP, como não chegou aos 5%, ficará de fora do Parlamento. Merkel não pode contar com os 4,8% recebidos por eles. Do lado oposicionista, a soma dos três partidos que entram no Parlamento são: SPD (25,7%), Verdes (8,03%) e Esquerda (8,6%) somam 42,6%. Como disse, o consórcio governista, com 41,5%, perdeu a maioria no Parlamento.

A saída é formar uma coalizão com um dos partidos de oposição e formar maioria. Entretanto, neste caso, a agenda política de Merkel vai sofrer alterações. Ela precisará abrir espaço no governo para seus adversários, provavelmente do SPD. Da possibilidade de uma maioria absoluta, Merkel terá que na realidade governar em coalizão.

A vitória foi bonita, mas na prática uma vitória com resultados práticos muitos ruins. A maioria se foi, assim como uma agenda livre de imposições da oposição.

quinta-feira, setembro 19, 2013

Sumiu o Decano

A decisão de Celso de Mello no caso do Mensalão vai além dos aspectos jurídicos. Sua decisão, na qualidade de ministro do Supremo Tribunal Federal, será sempre permeada por aspectos políticos. Talvez esta nuance não tenha ficado clara. Celso dizia que era mais um a votar. Errou. Não era. Na qualidade de decano, seu voto possui um viés qualificado. Vota por último exatamente em função disso. Sua posição hierárquica na corte é tão grande que sua decisão pode vir a mudar votos de juízes novatos. Assim, Celso de Mello não considerou dois aspectos em seu voto: o viés político e sua posição como decano.

O ministro não diverge sobre o mérito. Foi um dos mais contundentes votos pela condenação. Durante o julgamento usou sua condição de decano, o que faltou na admissibilidade dos embargos. Ontem deixou o mérito de lado, pois sabe que sua decisão formal enterrou o seu próprio julgamento sobre os fatos. No aspecto político, deixou claro que não seria influenciado pelas ruas. Mas na verdade as ruas não falaram. O tal gigante se revirou na cama durante um sono profundo mas não se acordou. Caso tivesse acordado e tomado a Praça dos Três Poderes na tarde de ontem, se no final de semana as manifestações tivessem tomado o Brasil pedindo a condenação dos réus, aí sim poderíamos falar em pressão da opinião pública. Na verdade, não houve pressão. As manifestações do meio do ano não tinham foco, tampouco objetivo ou liderança. Irão se perder no tempo antes da próxima eleição.

Celso de Mello enterrou a possibilidade dos condenados enfrentarem o cárcere. Este foi seu movimento político. Talvez tenha sido menos legalista e mais político do que ele próprio imagina. Sua decisão possui reflexos políticos da mais alta importância para o Brasil, seja de um lado do espectro ou de outro. Par uns, o Brasil acabou. Para outros, embalou na direção para onde sempre rumou.

Os reflexos políticos do voto do decano estão ligados ao futuro eleitoral. Uma condenação e prisão dos petistas envolvidos nas falcatruas do Mensalão teriam reflexo nas eleições do próximo ano. Repetiriam-se as cenas dos condenados sendo presos e a proximidade de todos com o poder. O desgaste do petismo seria inevitável. Com a decisão de ontem, nada muda. Os reflexos não serão sentidos e pavimenta-se cada vez  mais a reeleição de Dilma ou a volta de Lula, como o petismo preferir.

O fato novo seria uma indignação da classe média que aos poucos se espalhasse pela população. O sentimento e vontade do novo. Este é um problema, pois cria a chance de aventureiros chegarem ao Planalto. De qualquer forma, hoje, se um movimento desta envergadura se consolidar, o que acho difícil, teriam em Marina Silva e Joaquim Barbosa seus baluartes políticos. O Ministro do Supremo parece não pensar na possibilidade. Mas Marina Silva pensa dia e noite.

Celso de Mello manteve o Brasil no seu rumo. No caminho de sempre. Acomodados como mostra a história recente, afinal ele é produto deste meio. Faltou entender que ele não era apenas um juiz em Tatuí, mas o decano com o voto mais político da história do Supremo nas mãos.

Viagem Cancelada. Oportunidade Perdida

Dilma deveria aprender com Putin. Mas sejamos sinceros, a Presidente nunca foi uma política, portanto, não podemos esperar movimentos deste tipo vindos do Palácio do Planalto. Ela é uma ideóloga, como sempre disse, que ainda carrega no coração traços forte do pedetismo desenvolvimentisa de Brizola e na cabeça é embalada pelos novos companheiros petistas que a conduziram ao Planalto. Dilma é um produto desta realidade e seu governo é a maior tradução deste estado de coisas.

Na própria política doméstica Dilma sofre dificuldades. Falta entrosamento com os parlamentares, assessores e ministros. Dez entre dez pessoas que lidam com o governo em Brasília sentem falta pessoas como Lula e Fernando Henrique, cada um em seu patamar, mas ambos hábeis no jogo político e nas negociações com parlamentares.

Assim, o cancelamento da viagem da Presidente aos Estados Unidos traz um pouco de todos estes traços. Joga para a torcida, apontando um inimigo comum, movimento político já traduzido por Hayek em sua obra "O Caminho da Servidão" há tempos atrás. Acalma o petismo mais ideológico, que enxerga uma espécie de troco contra um suposto imperialismo que permeia o pensamento esquerdista e conforta o pedestimo ardente no coração de Dilma.

Contabilizado tudo isso, nos perguntamos sobre os desdobramentos práticos. Perdem os negócios, que necessitam do acerto de regras e negociações entre os dois mandatários. Perde também a diplomacia, que deixou escapar, mais uma vez por um ranço ideológico, a oportunidade de traduzir em ganhos políticos uma situação desfavorável.

Todos os países realizam espionagem. Rússia, China, Estados Unidos, Reino Unido, inclusive o Brasil. Assim como os chineses, os americanos foram pegos. Existe aí uma possibilidade de fazer render esta situação em favor do Brasil. Nosso país poderia contar com a simpatia e movimentos da diplomacia americana em um sem número de casos. Colocados na mesa, servem como instrumentos de negociação política na esfera internacional. Foi perdida a oportunidade de traduzir em ganhos políticos internacionais um vacilo dos americanos.

Enquanto governos forem refém de situações ideológicas, não existirá margem de negociação diplomática. Putin entende bem disso. É antes de tudo um pragmático. Coloca a Rússia em primeiro lugar e dentro da arena internacional consegue articular com habilidade incomum a posição de seu país, traduzindo em ganhos situações desfavoráveis. Perspicácia que falta a nossa Presidenta e o grupo de ideólogos em torno dela.

sexta-feira, setembro 13, 2013

Ficou Feio para Obama

Ficou feio para Obama. Depois de Putin ser responsável por uma virada política espetacular no caso sírio, o russo apareceu no New York Times com um artigo contundente ensinando os americanos a fazer política externa.

A reação aqui em Washington foi de todos os setores políticos, afinal não é todo dia que um dirigente russo empareda o Presidente norte-americano desta forma. Os setores mais moderados taxaram a situação de humilhante. Os conservadores acusam Obama, depois de perder o controle político interno, agora ser incapaz de ditar a política externa.

O timing da aparição do artigo no New York Times foi perfeito para Moscou, afinal, na noite anterior Obama tinha vindo a público explicar o caso sírio para os americanos e apresentar as razões de uma possível retaliação a Damasco. O artigo de Putin, na manhã seguinte, fez todos esquecerem que Obama sequer havia estado na televisão.

Putin, em seu artigo, fala da Guerra Fria, da importância do Conselho de Segurança, de ações multilaterais e do caso sírio, alertando para o fato de que as armas químicas podem ter sido usadas pelos rebeldes e entre eles existem dois grupos considerados terroristas pelo Departamento de Estado americano. Depois disso, toca nas feridas do Iraque, Afeganistão e Líbia. Agradece ao Presidente Obama por aceitar a mediação russa e por fim deixa um recado para os americanos, que se acham excepcionais: Deus criou todos iguais.

O artigo mostra que o líder russo está totalmente no controle da situação, como foi confirmado por um conselheiro da Casa Branca. Putin tomou a frente diante da indecisão e lentidão de Obama. Politicamente o Presidente abriu o flanco para que o russo se colocasse como o fiel da balança. Washington começou a semana empenhada em passar uma resolução no Congresso autorizando a guerra e chega na sexta-feira com John Kerry negociando um acordo em Genebra com o chanceler russo Sergei Lavrov. Levada pelos acontecimentos, a administração democrata mostrou falta de rumo e convicção, vacilante com uma biruta que muda ao sabor do vento.

Em suma Putin precisou de três dias para mostrar aos americanos a falta de convicção de seu líder. Como bom político, encontrou um vácuo e soube se posicionar. Depois de forçar os americanos a sentar na mesa e negociar, o antigo agente da KGB, acusado de fraudar eleições, caçar jornalistas e perpetuar-se no poder, subitamente passa a dar lições de democracia e multilateralismo ao Presidente dos Estados Unidos por intermédio do New York Times. A América sentiu-se humilhada, com razão.

quinta-feira, setembro 12, 2013

Saída Honrosa

"Obama busca sair desta situação que se meteu", me disse ontem um antigo conselheiro do governo Bush. Sem dúvida, é isso que o Presidente busca. A falta de apoio de uma coalizão consistente, dos britânicos, de uma resolução do Conselho de Segurança ou autorização do Congresso fizeram do Presidente um refém de suas promessas de limites e um líder vacilante perante os últimos acontecimentos. O imponderável, contudo, fez sua aparição e a ajuda veio de onde ele menos esperava: Moscou.

A proposta de Putin, por mais seja uma jogada política do líder russo, livrou Obama de uma triste derrota no Capitólio. No Senado poderia até conseguir a maioria, mas na Câmara sofreria uma derrota histórica. Agora, com a proposta russa na mesa, Obama preferiu segurar a votação. Foi prudente.

Putin deseja que Assad permaneça no comando da Síria. Muitos falam dos motivos econômicos russos para que isso permaneça como está, mas Moscou pensa mais adiante. Os motivos são outros. Putin sabe que lida na Chechênia com extremistas muçulmanos, de vertente sunita, os mesmos que podem chegar ao poder em Damasco caso Assad seja enxotado por forças americanas. A Síria se tornaria um campo de treinamento de terroristas chechenos que visam causar pânico na Rússia com vistas a independência de seu território. Este é um problema que Putin não deseja comprar. Esta posição russa agrada Irã e Iraque, governados por xiitas, e mantém o equilíbrio de forças na região.

Agora, do lado americano, por mais que Assad seja um ditador que possua atrocidades na biografia, é preciso se perguntar se realmente vale a pena a mudança de regime para os interesses americanos. Sete dos nove grupos que se opõe a Assad na Síria tem fortes ligações com a Al Quaeda. Caso Assad seja removido do poder uma ação militar, todo o arsenal químico do ditador sírio poderia cair nas mãos da Al Quaeda, o que não interesse Putin e tampouco os americanos.

Obama criou um problema para si e para o Ocidente quando determinou um limite para Assad. Enfraquecer o ditador sírio, muçulmano alauíta, apoiados pelos cristãos que vivem na Síria, e fortalecer grupos muçulmanos extremistas sunitas que visam tomar o poder, pode não ser a melhor alternativa. No Iraque, vale lembrar, ao custo de milhares de vidas de soldados americanos, subiu ao poder um governo muçulmano xiita aliado aos aiatolás iranianos. É preciso se perguntar se valeu a pena.

É hora de ponderação. Talvez manter o equilíbrio de forças existente na região seja o que mais interessa. Por mais que Obama diga que um consenso somente pode estar sendo desenhado em função da ameaça de guerra, sabemos que pode ser o contrário. Compelido a agir diante do movimento russo, Putin pode ter salvado Obama do pior: de se meter no atoleiro da guerra e ter inimigos dos Estados Unidos controlando as armas químicas de Assad.

quarta-feira, setembro 11, 2013

Eleições na Alemanha

A Alemanha enfrenta eleições muito importantes no dia 22. Sem dúvida o resultado mais importante e aguardado do ano, pois das urnas podem emergir os caminhos que a Europa tomará para sair da crise e também o futuro do Euro.

Angela Merkel tem aprovação na casa dos 60%, mas isto não quer dizer que ela terá uma eleição tranquila. O sistema eleitoral alemão pode pregar peças nos mais preparados analistas. O fato é que parece consenso que Merkel seja reconduzida, mas sem maioria absoluta. Ou seja, mesmo com aprovação de 60%, seu partido, CDU, não chegará a eleger 50% do Bundestag. Para formar um governo, precisará chegar aos 50% do parlamento aliada a outro partido - neste momento, a questão mais importante.

Merkel disputa seu terceiro mandato. Vem de quatro anos muito tranquilos, pois governa em coalizão com um parceiro em sintonia, os libertários da FDP. Entretanto, nos primeiros quatro anos teve que governar em coalizão com os social-democratas, do adversário SPD -  o que levou a implementação de uma agenda mais restrita. O receio é que a situação de oito anos atrás se repita e que Merkel tenha que montar um gabinete dividido com os social-democratas mais uma vez. Limitará muito sua linha de ação.

Este receio é real por dois motivos. O libertários tem perdido muito terreno. O FDP encontra-se muito fraco e talvez não alcance o número de votos suficientes para ajudar a CDU a chegar aos 50% do Bundestag ou mesmo entrar no parlamento. A outra é que a CDU sofreu derrotas importantes para o SPD em pelo menos cinco eleições estaduais, como na Baixa-Saxônia. No total foram 12 estados onde Merkel não alcançou maioria. O SPD passou a chamá-la de "rainha sem país", já que apesar das derrotas, ainda contava com alta popularidade. A dúvida é se as derrotas estaduais serão suficientes para abalar os votos da coalizão de Merkel nas eleições federais.

Existe também um outro cenário. Se o SPD reverter o favoritismo de Merkel (40%) usando como estratégia as eleições estaduais, é possível que os social-democratas (28%), aliados ao partido de esquerda, Die Linke (8%), e aos Verdes (entre 11% e 15%), alcancem os 50%. Este seria o cenário mais preocupante para a Europa.

Apesar do favoritismo de Merkel, todos os movimentos desta eleição devem ser observados com muito cuidado.

terça-feira, setembro 10, 2013

Saída Russa

Tudo estava pronto. Os americanos preparados, Israel avisado. Mesmo sem a autorização do Congresso, os Estados Unidos partiriam para cima de Assad. Ataques pontuais para punir o regime sírio. Eis que aparece o secretário de Estado John Kerry em coletiva em Londres.

O que ele ele disse mudou inteiramente a dinâmica desenhada até aqui. Em resposta a uma jornalista, disse que se Assad colocasse seu arsenal químico sob controle e supervisão internacionais, os americanos repensariam o ataque.

Foi então que a diplomacia russa entrou em ação de forma rápida. Seguei Lavrov disse que colocará em pauta um plano para que os inspetores da ONU tenham liberdade plena para realizar suas inspeções. Em ato contínuo o governo sírio disse que via com bons olhos a proposta russa e está disposto a negociar uma saída dentre os parâmetros esboçados por Moscou. 

Isso tudo depois de Assad dar entrevista para a rede americana CBS, como sempre muito diplomático e cortês. Mesmo assim deixou claro que os americanos podem esperar tudo, se colocarem os pés na Síria. Ou seja, ameaçou que Irã e Hezbollah estão dispostos a retaliar interesses americanos caso seu país seja atacado. 

Enquanto isso um vacilante e perdido Presidente busca se localizar entre a mudança das peças no tabuleiro de xadrez. Obama, que buscava autorização do Congresso para atacar Assad, talvez tenha que deixar seu plano de lado, especialmente agora que Assad diz concordar com inspeções e que a Rússia tomou o controle da situação, como apoio de China e Irã. O Presidente americano está dizendo que a solução proposta por Moscou foi causada em razão da ameaça americana, ou seja, está tentando sair-se bem da situação.

Como Putin sabe muito bem controlar as peças no jogo, tudo indica que provocou um xeque em Obama. Os americanos não tem como seguir com um ataque havendo um plano de saída diplomática sendo negociado. Ao mesmo tempo, se funcionar, os russos sairão deste imbróglio como aqueles que evitaram o conflito e encontraram uma saída diplomática, levando a ONU de volta a Damasco. Se vai funcionar, bem, isso é outra história. O fato é que John Kerry, de forma desastrada, conseguiu tirar o regime de Assad da grelha.

Não devemos subestimar Putin. Tampouco superestimar Kerry, afinal, ele não é um Kissinger.

segunda-feira, setembro 09, 2013

Austrália Conservadora?

Tony Abbott é o novo chefe de governo da Austrália. Ele levou os conservadores a uma vitória histórica, devolvendo seu partido ao governo depois seis anos de gabinete trabalhista. Abbott é discípulo político de John Howard, que comandou com facilidade a política australiana por 11 anos.

A eleição de Abbott tem relação direta com os trabalhistas ou com as divisões internas do Labour Party. A desordem no partido que comandava o governo levou a uma divisão de poderes que desaguou na derrota deste final de semana. Eleito em 2007, o competente Kevin Rudd chegou a Camberra depois de mais de uma década de governo conservador. Mas apenas três anos depois veio o golpe de dento do partido, em 2010. Sua colega de Melbourne (onde se joga a política mais pesada da Austrália), Julia Gillard, colocou sua liderança em cheque. O partido ficou com Gillard e afastou Rudd do comando. Ela assumiu o governo. Neste ano, o caso se inverteu e Rudd retomou o governo nos últimos meses, mas apenas como uma alternativa viável para enfrentar as eleições. Não foi suficiente e os trabalhistas perderam o controle do parlamento.

Tudo isso, além de uma campanha competente do lado conservador, levou Abbott a uma vitória maiúscula. Terá maioria absoluta na Câmara e com isso irá empurrar a agenda de seu partido adiante. Seu estilo é muito parecido com o de Howard, apesar de ser menos carismático, o que certamente dará uma pegada mais populista, mas mantendo uma posição mais liberal em termos econômicos e uma posição conservadora em relação aos temas das liberdades individuais - como casamento gay, que estava na agenda dos trabalhistas.

O Labour, por sinal, enquanto governo, passou muito bem pelas crises internacionais e entrega um governo com desemprego na casa dos 5%. A Austrália cresce ininterruptamente há 22 anos.

Mesmo assim, não há dúvida que houve uma guinada conservadora, sob todos os aspectos. Agora é preciso entender o quadro com parcimônia. O gabinete trabalhista vinha de anos de lutas internas pelo poder, o que desgastou de sobremaneira seus líderes e limitou a linha de ação de Rudd na campanha - com perdas em New South Wales e Queensland. É possível que se reorganizem e voltem fortes na próxima eleição. Do outro lado, sabemos que os conservadores são muito competentes na manutenção do poder. O futuro reserva momentos políticos interessantes na Austrália.

sexta-feira, setembro 06, 2013

Jeitinho Americano

Como a situação de Obama anda cada vez pior no Congresso, já se fala aqui em Washington de alternativas para o ataque caso fique claro que haverá veto quanto a decisão de intervir na Síria.

A estratégia mais clara no momento está em aproveitar o relativo bom momento que a proposição encontra no Senado. Por lá, tudo indica que Obama pode conseguir passar sua iniciativa. Ali existe uma maioria democrata que pode ser pressionada a apoiar o Presidente. Na mesma Casa também existem falcões do partido republicano que estão lado da Casa Branca nesta questão, como o senador John McCain.

O problema de Obama está na Câmara onde a possibilidade de derrota não é só real, mas se ocorresse seria um vexame. A oposição por lá é enorme, tanto entre democratas, quanto republicanos. O Presidente, John Boehner, apóia a intervenção, mas não se moverá para articular votos para aprová-la. A tendência hoje é de uma derrota humilhante. A conta é de 115 a 130 democratas a favor e 24 republicanos. A Casa Branca espera levar 60 votos do oposicionista GOP. É muito otimismo.

A opinião pública tem feito a diferença. Ontem mesmo o senador John McCain teve que enfrentar a fúria dos seus eleitores em Phoenix, no Arizona. O senadores são mais blindados, pois buscam votos por todo o estado que representam, já os deputados, eleitos por distritos, sofrem uma pressão mais direta e muitos estão acuados diante da pressão de seus eleitores contrários a uma intervenção na Síria.

A saída de Obama, no momento, é atacar logo depois da aprovação no Senado, como fez Bill Clinton em relação ao Kosovo, na década de 90. Isto liberaria os deputados do embaraço de votar a favor do conflito, mas também mandaria uma mensagem negativa para a opinião pública e para os deputados contrários a ofensiva, que ocupariam a imprensa para atacar o Presidente. Obama estaria pisoteando a Câmara. Pegaria mal. Mas é uma saída, um jeitinho americano que Obama busca, pois se precisar dos deputados, a tarefa será muito dura.

quinta-feira, setembro 05, 2013

Cálculo Político

Hoje cresce a percepção de que Obama segue enfraquecido entre os parlamentares. Ontem foi a primeira vitória, mas diante de um cenário preocupante. Mesmo na Comissão de Relações Exteriores do Senado, onde os democratas tem maioria, com apoio dos falcões republicanos, o placar foi apertado, com 10 votas a favor e 7 contrários.

O apoio da ofensiva entre a população continua em declínio e de olho neste dado, Marc Rubio, um dos mais fortes candidatos republicanos a cadeira de Obama nas próximas eleições, mudou seu voto. Agora é contrário ao conflito. Deve ter se lembrado como o voto a favor da guerra fez estragos na campanha de Hillary Clinton em 2008.

Mas haverá intervenção na Síria, seja com ou sem autorização do Congresso americano. Obama está decidido e Rubio sabe disso e sua mudança de voto tem relação direta com este cálculo político. A demora de Obama na espera de uma autorização do Congresso, revestindo seu ato de um suposto amparo democrático, abriu a possibilidade de Assad reposicionar seu arsenal e reorientar seus comandos. Acertar com clareza todos os depósitos de armas químicas não será tarefa fácil. A inteligência terá trabalho redobrado com esta demora.

Os parlamentares também pensam nas conseqüências. A intervenção no Iraque, do ponto de visto político, foi um desastre. Tirou um governo laico, identificado com os sunitas, e levou ao poder um grupo xiita que está aliado com o Irã. Na Síria, a eventual deposição de Assad poderá levar ao poder grupos ligados a Al Qaeda. Os cristãos sírios estão com Assad. Como se não fosse o bastante, o New York Times colocou hoje na capa uma foto, esta que ilustra este post, com a oposição síria executando aliados de Assad.

O Congresso precisa pensar muito se quer realmente dividir esta responsabilidade com Obama, mesmo com todo a força do lobby empresarial pró-guerra nos corredores. Se ele vai intervir com ou sem autorização do Capitólio, porque os parlamentares precisam colocar sua credibilidade em risco? Este foi o cálculo de Rubio. A maldição de Cameron ronda a Casa Branca.

quarta-feira, setembro 04, 2013

Vox Populi

Obama partiu para Suécia, onde está agora, e depois para Rússia, onde haverá uma reunião do G20. Em Washington ficaram os assessores e líderes do seu partido envolvidos nas conversas que visam aprovar a intervenção na Síria. O timing da viagem foi péssimo para o Presidente, que precisaria estar por aqui para conduzir as negociações.

Mas como escrevi ontem, o segredo do jogo está nos deputados que flertam com a reeleição no próximo ano e para isso, a tendência da opinião pública pode balizar mais seu voto do que a lealdade ao Presidente. Fazendo um paralelo, a derrota de Cameron na Câmara dos Comuns na última semana teve muito mais conexão com a tendência do eleitor britânico do que com as verdadeiras convicções dos conservadores que traíram o gabinete.

E nos Estados Unidos as notícias não são boas para Obama. Pouco a pouco as pesquisas mostram uma clara inclinação contrária ao pedido de intervenção. A NBC trouxe números que mostravam a situação empatada, com 50% para cada lado. Hoje, a pesquisa Washington Post/ABC trouxe números que começam a preocupar Obama. 59% dos americanos se opõe ao envolvimento de seu país neste conflito.  Entre os independentes, aqueles que verdadeiramente desequilibram uma eleição, a situação é ainda mais aguda: 66% são contra e apenas 30% aprovam.

A intervenção proposta por Obama perde também entre democaratas e republicanos. No partido do Presidente, 54% desaprovam. Entre os republicanos este número sobre para 55%. Logo, entre os democratas, a aprovação de uma ação militar tem o suporte de 42% e entre os partidários do GOP (Grand Old Party, como são chamados os republicanos por aqui), 43%. No cômputo geral, apenas 36% dos americanos aprovam a idéia de meter os pés nas Síria.

Estes são números que devem preocupar Obama, pois podem balizar de forma definitiva o posicionamento de muitos parlamentares que hoje se mostram indecisos. Joe Biden, o vice-presidente, que tem décadas de experiência no Congresso, ficou em Washington para tentar uma sintonia fina entre os indecisos. Tarefa árdua e difícil. Depois do Afeganistão e Iraque, o que os americanos mais querem é recuperar a economia. Uma outra guerra está fora de questão.

terça-feira, setembro 03, 2013

Política Interna

A política interna afeta a política externa. Obama jogou suas fichas nesta máxima quando decidiu buscar autorização do Congresso para intervir na Síria. É uma estratégia arriscada, como lembrei no post de ontem, especialmente para um Presidente que anda cambaleante em sua relação com o parlamento. Mesmo assim, foi a aposta do Presidente.

A conta que deve ser acompanhada é esta: os Democratas estão de olho em 17 assentos na Câmara e os Republicanos em 6 assentos no Senado. Isto é o que falta para cada partido virar a maioria de cada Casa nas eleições do ano que vem. Hoje, certamente a conta é mais fácil para os republicanos, não por precisarem de menos parlamentares para virar a maioria no Senado, mas porque, sendo oposição e com o governo paralisado, a tendência é de vitória. O trabalho dos democratas em virar 17 distritos é mais preocupante. Caso não consigam, o governo Obama permanecerá paralisado até o fim do seu mandato presidencial.

Mas o que tudo isso tem a ver com a Síria? Explico. Muitos dos distritos que se alternam entre vitórias democratas e republicanas podem virar dependendo do voto em relação a Síria. Em San Diego, na Califórnia, por exemplo, onde existem muitos veteranos das guerras do Iraque e Afeganistão, um voto em favor da intervenção na Síria pode acabar com as chances de reeleição do deputado democrata Scott Peters. Aqui nos Estados Unidos os distritos, que elegem os deputados, são duros na cobrança de posições coerentes e em defesa de sua comunidade. Assim como Peters, um número enorme de deputados, antes de qualquer coisa, está pensando em sua reeleição no próximo ano.

Assim, a estratégia de Obama tem sido atacar por cima o Partido Republicano. Angariou os apoios dos senadores John McCain e Lindsey Graham, do Presidente da Câmara, John Boehner e do senador Marc Rubio, que sonha com a candidatura presidencial em 2016. Alcança assim os falcões, mas o nicho libertário liderado por Rand Paul certamente votará contra a intervenção. Isto levará Obama a buscar fechar o próprio partido em torno de sua agenda, algo difícil, pois a lealdade ao Presidente hoje pode ser tornar a principal causa de derrota na tentativa de reeleição de 2014.

Em resumo, Obama, precisa garantir algo de muito valioso a esses deputados, algo que compense o voto pró-intervenção e tire o peso de seus ombros em 2014. Vejam que curioso, talvez o destino de Assad esteja nas mãos de um deputado do interior de Oklahoma.

segunda-feira, setembro 02, 2013

Nas Mãos do Congresso

Neste feriado por aqui, Washington parece vazia, mas os bastidores estão agitados. O Congresso permanece em recesso, mas as articulações são intensas. Ontem, em pleno domingo, 70 parlamentares estavam no Capitólio. Hoje, o senador John McCain se encontra com Obama na Casa Branca. O motivo é o pedido de autorização do Presidente ao legislativo para avançar sobre Assad. Um risco político que, mal calculado, pode trazer muita dor de cabeça para o Salão Oval.

Obama enfrenta resistências entre Republicanos e Democratas. Até seus pares dizem que buscar aval no Congresso é tentar empurrar o ônus da intervenção para o país inteiro, tirando a responsabilidade somente de seus ombros. Será uma votação dura, tanto na Câmara, quanto no Senado, com a tendência de ser mais apertada na Câmara, onde o republicano John Boehner, que comanda a casa, também comanda o show. No Senado, se o Presidente conseguir um acordo mais amplo com John McCain, que pode carregar votos importantes, a situação pode ser menos dramática.

Existe também o problema da retaliação, que pode vir tanto de Assad, como do Irã e possivelmente do Hezbollah. Ampliar o conflito seria preocupante e a imagem do Estados Unidos pode sair muito arranhada desta ação. Os parlamentares mais libertários, por exemplo, se questionam sobre a necessidade de os americanos se envolverem neste conflito, já que o Conselho de Segurança não passou resolução neste sentido, não será possível uma ação via Otan e também os principais aliados estão fora, como o Reino Unido. Uma ação solo, mesmo que acompanhada dos franceses, pode ser danosa para a imagem dos EUA e de Obama.

Mas a Casa Branca está em ação permanente no Congresso. Buscará esta maioria de qualquer forma. Uma derrota seria um desastre para Obama, que precisará agir sem autorização do Congresso. Isto mostrará que ele está passando por cima do legislativo e calibrará as candidaturas republicanas ao Capitólio em 2014. Foi uma jogada política muito arriscada. Se a votação fosse hoje, a tendência seria de derrota.

domingo, setembro 01, 2013

As Opções de Barack

Enfim, o homem que chegou ao poder com um discurso conciliatório, com a promessa de terminar guerras, subitamente encontra-se em uma encruzilhada entre história e realidade. Obama irá intervir na Síria.

Na sexta-feira passei pela frente da Casa Branca onde um número tímido de manifestantes mostrava-se indignado frente a decisão praticamente já tomada de intervenção. O número de turistas, entretanto, superava o de manifestantes em larga margem. Lá dentro, Barack Obama via-se em uma situação complicada. Sem apoio dos britânicos, sem aval do Conselho de Segurança, o Presidente percebeu que talvez tivesse que enfrentar o conflito no Oriente Médio somente acompanhado dos franceses.

A vida dá muitas voltas. Hoje, o Secretário de Estado, John Kerry, que fez campanha pelo fim da guerra no Iraque quando buscava o lugar de Bush no Salão Oval, é um brutal defensor da intervenção. O motivo? Armas de destruição em massa. A fonte? Informações coletadas pela inteligência. O mesmo roteiro que no passado levou os americanos para Bagdá. Na Casa Branca um Barack Obama que atacava George Bush por meter os americanos no Iraque, hoje advoga a necessidade de intervenção na Síria. Por fim, para fechar o jogo de ironias, o único aliado importante ao lado dos americanos é a França - principal opositora da intervenção no Iraque.

Enfim, Obama tentou uma coalizão. Não deu certo. Tentou o Conselho de Segurança. Não funcionou - lá estão China e Rússia, prontos para barrar qualquer iniciativa deste tipo. Sobrou o Congresso. O Presidente buscará o aval dos parlamentares para intervir. Conseguirá? Provavelmente sim, mas tudo indica que está disposto a chegar a Damasco mesmo sem o sinal verde do legislativo americano. John Kerry passará por todos os prestigiados programas políticos de televisão deste domingo para explicar este caminho.

Ao fim e ao cabo, Obama tenta fazer diferente, mas é provável que tome o mesmo caminho de George Bush. Nada como o tempo para repetir a história e mudar seus protagonistas. Nada como a realidade e a solidão do Salão Oval.